Análise
da Planilha de Custos do Transporte Coletivo de Aracaju 2013
Por:
Movimento Não Pago
Nas
últimas décadas a população da Grande Aracaju vem sofrendo com as péssimas
condições do transporte coletivo. Além de sermos transportados em ônibus
quebrados, sujos e superlotados, pagamos uma passagem extremamente elevada (a
2ª tarifa mais cara do nordeste), que não condiz com a qualidade do serviço
oferecido, tampouco com os aspectos geográficos locais (cidade plana, de
pequena extensão territorial).
O
Sistema de Transporte Coletivo de Aracaju é custeado integralmente pelos
próprios usuários do sistema, sendo que o valor da tarifa deve refletir o custo
operacional das empresas de ônibus (combustível, lubrificantes, pneus, peças e
acessórios, salários, despesas administrativas, depreciação, lucro empresarial,
pró-labore dos diretores das empresas, etc.), tudo isso dividido pelo número
total de passageiros.
No
entanto, a atual forma de cálculo da tarifa atribui um custo muito maior que o
custo real, fazendo com que os usuários paguem muito mais que o valor
necessário para a manutenção total do serviço.
Três
fatores contribuem diretamente para essa falha:
I
– A não utilização do menor preço do mercado atacadista para o valor unitário dos
insumos utilizados nos veículos por parte do Setransp (preço de combustíveis,
óleos, lubrificantes, pneus, etc., acima do menor preço de mercado), bem como a
atribuição de custos de insumos que não existem (o Setransp inclui custo com
câmara de ar, quando toda a frota de ônibus se utiliza de pneus com tecnologia Tubless, sem câmara de ar. Além disso,
incluem nos custos, os salários de cobrador e motorista correspondente à frota
de Midi e Micro-ônibus, onde existe apenas um funcionário realizando as duas funções);
II
– Forma de cálculo generalizada que considera todos os veículos da frota como
sendo Convencionais, omitindo a existência de Midi e Micro-ônibus, que possuem
custos operacionais muito menores que os veículos convencionais;
e
III – A defasagem dos coeficientes de consumo – os coeficientes utilizados para
o cálculo são baseados em pesquisas da década de 80, que não observam o aumento
da eficiência, dada a evolução tecnológica ocorrida no setor de transportes nos
últimos anos.
A
nossa análise é feita sobre a Planilha de Custos pela qual o Setransp fez o
pedido de reajuste à SMTT (29/01/2013).
Resta
informar que todo esse custo que não existe, mas que é cobrado na tarifa, se transforma
em receita para as empresas de ônibus, que além do lucro legal (3,9% da
tarifa), acumulam mais essa remuneração indevida, que onera excessivamente os
usuários.
Esse
problema já foi apontado pelo Movimento Não Pago em janeiro de 2012, quando
levou uma representação ao Ministério Público Estadual, pedindo a realização de
uma auditoria dos custos e lucros das empresas de ônibus, com participação da
sociedade civil. Contudo, o MPE ainda não deu uma manifestação sobre o pedido.
Ressalte-se
que a planilha tarifária que orienta o cálculo da tarifa do transporte coletivo
de Aracaju, estabelecida pela Lei Municipal 1765 de 1991, segue o modelo de
cálculo do extinto GEIPOT (Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes)
vinculado ao Ministério dos Transportes. Nesse sentido, a planilha vem se
orientando por coeficientes de consumo de combustível, óleos, lubrificantes,
pneus, pessoal, etc. estabelecidos ainda na década de 80, portanto, bastante
defasados. O próprio GEIPOT, antes da sua extinção, em 1994[1],
atualizou os coeficientes, tendo em vista o aumento da eficiência do setor de
transporte.
Para
manter a coerência do cálculo tarifário algumas cidades realizam estudos com a
própria frota de ônibus, com intuito de verificar o real coeficiente de consumo
dos veículos. Destaquem-se os estudos realizados pela UFRJ acerca dos coeficientes
de consumo do Sistema de transporte Urbano de Petrópolis (2004)[2], e
a pesquisa realizada pela Empresa Pública de Transportes e Circulação – EPTC,
que propõe uma revisão dos coeficientes de consumo e índices de uso da planilha
tarifária de Porto Alegre (2003)[3].
Por
sua vez, em Aracaju, o Setransp e a SMTT continuam se utilizando dos índices
mais defasados, fato que torna a tarifa de ônibus de Aracaju muito acima dos
custos reais do sistema, o que se revela na sua amarga posição no ranking das
passagens de ônibus (2ª tarifa mais cara do nordeste).
Não
bastasse tal defasagem, a elaboração do cálculo da planilha não conta com a
devida especificação dos tipos de veículos que compõem a frota do transporte
coletivo urbano local. Assim, o índice de consumo de um Midibus ou Micro-ônibus
(que compõem 15% da frota segundo a SMTT) é igualado ao de um ônibus Convencional.
Além
disso, não são apresentados os custos específicos de cada empresa, mas apenas
uma análise generalizada de toda a frota do sistema, fato que omite visualizar
quais empresas são menos eficientes, e, por isso, contribuem para o aumento dos
custos do sistema, e do preço da tarifa.
Outro
ponto bastante questionável é a ausência de comprovação do preço dos insumos e
dos veículos informados pelo Setransp. É de fundamental importância para o
cálculo do custo real das empresas que os valores sejam estabelecidos a partir de
notas fiscais das empresas de ônibus, tendo em vista que elas gozam de grandes
descontos, sobretudo na compra de combustível e pneus.
A
análise que segue realizará uma revisão dos preços dos insumos e dos
coeficientes de consumo dos três principais componentes da tarifa (combustível,
rodagem, e pessoal), apontando também como a especificidade de cada tipo de
veículo (ônibus Convencional, Midi e Micro-ônibus) reflete em custos menores e
mais próximos à realidade, logo, refletindo na necessidade de reduzir a tarifa
atualmente cobrada na Grande Aracaju.
1. Revisão do preço do combustível
e do seu coeficiente de consumo
Segundo
o Setransp, o item Combustíveis
representa 20,11% do valor da tarifa, sendo que o preço atribuído ao litro do
óleo Diesel é R$ 2,1446, e o coeficiente de consumo do combustível do veículo
corresponde a 0,41 Litros/Km. Como o percurso médio mensal é de 7.615,10
Km/veículo, o gasto total mensal da frota operante (522 ônibus) com óleo diesel
é de R$ 3.495.233,06.
Em
pesquisa de mercado realizada na Grande Aracaju, entre os dias 28/02 e 04/03,
constatou-se que o menor preço do diesel no atacado varia entre R$ 2,07 (Diesel
BS 50) e R$ 2,10 (Diesel S 10), sendo o valor mínimo, portanto, R$ 0,07 menor
do que o alegado pelo Setransp.
Em
relação ao índice de consumo, o Setransp não especifica o consumo dos
diferentes tipos de veículos, alegando que o consumo de um midi ou micro-ônibus
é igual ao dos ônibus convencionais, atribuindo o coeficiente defasado do
GEIPOT de 0,41 Litros/Km. Contudo, é flagrante que dada a diferença de potência
entre tais veículos, o consumo de diesel dos midi e micro-ônibus sejam menores
que o dos ônibus convencionais. É o que nos informa a pesquisa da UFRJ (2004),
que aponta um coeficiente de 0,232 Litros/Km para os micro-ônibus. Para os
veículos leves, onde se encaixam os ônibus convencionais, a pesquisa aponta um
coeficiente de 0,331 Litros/Km, apontando uma melhoria na eficiência em relação
á última atualização feita pelo GEIPOT, que indica um índice de 0,35 Litros/Km
para tais veículos.
Utilizando
o valor mínimo do mercado atacadista encontrado para o litro do diesel (R$
2,07), bem como os coeficientes de consumo mais atualizados e específicos para
cada tipo de veículos, propomos uma revisão do custo mensal com combustíveis
para R$ 2.601.825,66, reduzindo em 25,57% o valor alegado pelo Setransp.
2. Revisão do preço dos pneus e da
sua vida útil
Segundo
o Setransp, o item Rodagem (pneus, câmara de ar, protetor, e recapagem), representa 6,61% do valor da tarifa, sendo que o preço atribuído
ao pneu é R$ 1.418,33 (unidade), ao serviço de recapagem R$ 380,00, à câmara de ar R$ 71,83 (unidade), e ao protetor (para câmara de ar) R$ 38,93 (unidade).
Além disso, o Setransp atribui aos pneus uma vida útil de 30.000 Km,
considerando ainda que a cada recapagem são acrescidos 10.000 Km de vida útil.
Como são utilizadas 3 recapagens em cada pneu, a quilometragem total média por pneu é 60.000 km.
De
início, segundo avaliação dos pneus utilizados pela frota do transporte
coletivo da Grande Aracaju, constatou-se que a frota, em quase sua totalidade,
se utiliza de pneus com tecnologia Tubless,
que não necessitam de câmara de ar nem de protetor, portanto os valores
atribuídos a estes insumos devem ser excluídos do cálculo da tarifa. Isso, por
si só, já reduz o valor da rodagem em 11,5%.
O
Setransp alega um preço de R$ 1.418,33 para um pneu, porém não especifica o
tipo nem a marca dos pneus utilizados. Na nossa pesquisa constatamos que o pneu
mais caro utilizado pela frota é o Good
Year G665 Plus para ônibus convencional, sendo utilizados também pneus de
outras marcas menos conhecidas e com preços bem menores, e também pneus aro
17,5 para micro-ônibus, que são em média 50% mais baratos que os pneus de
ônibus convencionais. Em pesquisa de mercado realizada na Grande Aracaju, entre
os dias 28/02 e 04/03, constatou-se que o menor preço para o pneu Good Year G665 Plus no varejo é R$
1.375,00, sendo o preço do mesmo modelo para rodas aro 17,5 igual a R$ 785,00.
Para o atacado, a depender do tamanho da compra, o valor se reduz em até 15%,
configurando-se então o menor preço do mercado atacadista para os pneus G665
Plus aro 22 e 17,5 respectivamente em R$ 1.168,75, e R$ 667,25. Isso reduz o
preço médio do pneu para R$ 1.093,50, 23% menos que o preço unitário informado
pelo Setransp.
Além
disso, o cálculo de vida útil do pneu feito pelo Setransp é bastante defasado,
baseado nos estudos do GEIPOT dos anos 80. A atual tecnologia de rodagens,
conforme pesquisa da EPTC (2003), permite ao pneu sem câmara, com duas
recapagens, uma vida útil de 172.197,19 km, um aumento de 187% à vida útil dos
pneus atribuída pelo Setransp.
Todas
essas revisões sobre o custo total da rodagem impacta numa redução de 77,66% ao
valor original atribuído pelo Setransp.
3. Revisão das despesas com pessoal
e do Fator de Utilização de pessoal por veículo
Segundo
o Setransp, o item Despesas com Pessoal
representa 44,72% do valor da tarifa, sendo o salário de cada categoria
definido por convenção coletiva de trabalho, exceto o de Pessoal Administrativo.
Para calcular a despesa total com pessoal, o salário, encargos sociais e ticket
de cada categoria é multiplicado pelo seu Fator de Utilização, que corresponde
ao número de trabalhadores de cada categoria por ônibus da frota operante. São esses
os valores informados pelo Setransp:
Fator de Util.
|
Salários
|
Encargos Sociais
|
Ticket
|
|
Motoristas
|
2,6
|
R$
1.395,34
|
R$
877,25
|
R$ 330,00
|
Cobradores
|
2,6
|
R$
777,07
|
R$
488,54
|
R$ 330,00
|
Fiscais / Despachantes
|
0,36
|
R$
1.248,39
|
R$
784,86
|
R$ 330,00
|
Pessoal de
Manutenção
|
0,8
|
R$
877,52
|
R$
551,70
|
R$ 330,00
|
Pessoal
Administrativo
|
0,13
|
R$
11.074,68
|
-
|
R$
2.098,80
|
Ocorre
que o Setransp não observa as especificidades de cada tipo de veículo, omitindo
que Mini e Micro-ônibus não possuem cobradores, uma vez que o motorista realiza
as duas funções, recebendo remuneração apenas de motorista. Logo o fator de
utilização de Cobradores deve ser reduzido para 2,2%.
O
fator de utilização de fiscais e despachantes (0,36) indica que existem em todo
o sistema cerca de 188 trabalhadores dessa categoria. No entanto, nos últimos
anos, com a implantação da bilhetagem e do sistema de GPS, houve uma grande
redução no número de fiscais e despachantes, portanto o índice estabelecido em
1991 não deve ser adequado à nova realidade do sistema de transporte coletivo.
Deve ser feita uma avaliação se as empresas estão pagando salários para o
número alegado de fiscais e despachantes.
Já
em relação ao fator de utilização do Pessoal de Manutenção, destaque-se que na
última atualização do GEIPOT, definiu-se como índice máximo para o fator de
utilização dessa categoria 15%. O coeficiente alegado pelo Setransp é muito
superior (80%). A adequação ao índice do GEIPOT (15%) refletirá numa grande
redução do gasto com pessoal.
Por
fim, o Setransp alega que o fator de utilização do Pessoal Administrativo é 13%,
ou seja, 68 trabalhadores. Mas na verdade, por não haverem encargos sociais,
supõe-se que trata-se de cargos de direção, que recebem pró-labore e não
salário. É necessário investigar essa questão mais a fundo, pois é bastante
questionável que possam existir 68 cargos de direção no Sistema de transporte
Coletivo da Grande Aracaju. Além disso, o valor salarial para esses cargos fica
a mercê da definição dos próprios empresários, que podem se auto premiar com altos
salários, jogando a conta para o usuário que paga a tarifa. Não a toa, o
salário (ou pró-labore) dos cargos de direção é tão acima da média das outras categorias
R$ 11.074,68, bem como o ticket R$ 2098,80. Uma redução do pró-labore para uma
faixa aceitável (redução de 50%) também contribuiria bastante para a redução do
custo total do sistema, e da tarifa de ônibus.
Considerações finais
A
revisão aqui proposta dos três principais componentes da tarifa de ônibus garante
de imediato uma redução da tarifa na ordem de 19,39%, chegando ao valor de R$
1,8137. Ressalte-se que a análise, que se centrou apenas sobre os itens combustível, rodagem e pessoal, pode ser feita para os demais
elementos que compõem a tarifa.
A
análise do cálculo de depreciação e remuneração da frota, por exemplo,
apresenta, a priori, falhas que podem garantir uma redução ainda maior dos
custos do sistema. Ocorre que é atribuído um único valor, na ordem de R$
243.126,67 para todos os veículos. Quando na verdade, existem veículos bastante
diferenciados, e com valores muito menores do que esse alegado, sobretudo os
Midi e Microônibus. Contudo, para a realização dessa análise, é necessária a
avaliação dos documentos de todos os veículos da frota.
Por essa razão,
reforçamos o pedido de realização de uma auditoria com participação popular dos
custos e lucros das empresas. Apenas dessa maneira será possível conhecer na
essência o custo real do sistema de transporte coletivo da Grande Aracaju.
Olá, Bom dia.
ResponderExcluirVenho aqui parabeniza-los pelo excelente trabalho
feito por vocês aqui em Sergipe.
Venho através desta para também divulgar um novo
grupo no facebook da Anonymous Sergipe,
segue o link abaixo:
http://www.facebook.com/groups/AnonymousSergipe/
Gostei muito do trabalho aqui exposto.Muito bom mesmo.
ResponderExcluirParabéns!
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirparabéns, deveriam propagar mais a ideia, eu por minha parte já estou fazendo isso...
ResponderExcluirOnde eu consigo uma cópia da planilha de custos?
ResponderExcluirAqui amigo
Excluirhttp://movnaopago.blogspot.com.br/2013/03/smtt-divulga-planilha-de-custos-do.html
VOCÊS VÃO ACEITAR UMA "REDUÇÃO" NO PREÇO DA PASSAGEM PAGANDO ESSE REDUÇÃO COM DINHEIRO DO PRÓPRIO BOLSO ?!
ResponderExcluirEstamos vendo nos meios de comunicação os governos renunciando receitas dos impostos, porquê esses pobrezinhos de empresários picaretas não podem perder um centavo no preço das passagens. Isso quer dizer que essa redução está sendo paga com dinheiro do nosso próprio bolso! Ora, não sei se vocês sabem, mas mais impostos significa mais dinheiro para obras públicas, ou seja, é mais dinheiro para ser gasto com a própria população. Não vale dizer que esse dinheiro não vai para o povo mas para o bolso dos políticos. É que, mesmo que isso tenha um fundo de verdade, ao menos uma parte reverte para a população, ao passo que a renúncia dos impostos só quer dizer que o empresário vai dar uma reduçãozinha safada no preço, na data da redução e depois vai embolsar SEMPRE a diferença ocasionada pela renúncia dos impostos, e nunca mais a população vai ver o dinheiro desses impostos, ainda que seja uma pequena quantidade dele. O espertinho do Alkman (PSDB), governador de São Paulo, vai para televisão dizer que os "pobrezinhos" dos empresários não iriam suportar uma redução no preço das passagens, mas "ingenuamente" esquece que o consumidor sempre paga a passagem como se deslocasse até o final da linha, mas a grande maioria sempre salta antes do final da linha. Como se não bastasse, o cálculo das passagens sempre leva em conta a lotação normal dos veículos, e todos sabemos que as empresa extrapolam várias vezes a lotação dos veiculos, com a conivência criminosa, remunerada ou não dos fiscais das prefeituras e guarda de trânsito. Repito então, vocês vão aceitar uma "redução" no preço das passagens paga com dinheiro do seu próprio bolso?! Esses picaretas políticos estão lhes dando uma redução com uma mão, ao mesmo tempo que nos roubam com a outra, renunciando impostos em prol de empresários picaretas, que muitas vezes lhes pagam propinas!